Por Rafael Amorim
"Cream cracker, bisteca, abacaxi e um coração aos pedaços. O que não faz sentido é o que torna o som da recente (mas já barulhenta) Cidade Dormitório, ainda mais interessante. O barulho é explicável pelo sucesso que a banda tem feito em seu curto período de existência. Formada “lá pro meio” de 2015, Yves Deluc (vocal e guitarra), Lauro Francis Carvalho (baixo), Heder Nascimento (guitarra) e Fábio Aricawa (bateria e backing vocals) conseguiram, desde então, destaque em um cenário autoral que ainda escala montanhas pra se fazer notado. E se definir o gênero do som produzido é difícil – um percurso pelo indie rock e o rock psicodélico – descobrir o ponto certo da mistura é ainda mais complicado. O fato é que as composições ajudam bastante – as 3 primeiras de Deluc e a última resultante de um “improviso transcendental de pessoas famintas”. O cotidiano que garante a simplicidade das letras ganha teatralidade com os arranjos, as variações dos vocais e o sarcasmo para onde todo o conjunto caminha. O tom cômico denota a sutileza. É bonito, é engraçado e também estranhamente triste. E tudo feito de forma aparentemente despretensiosa. A constatação da não-intenção está na minha música favorita do EP, “Agora o Meu Coração é Um Lixeiro Azul Vazio Escroto”, feita no meio de um terminal de ônibus. Quem ainda não ouviu a faixa provavelmente não se identifique com as palavras, mas só é preciso conhecê-la uma vez pra se dar conta de que não existe nada melhor do que um lixeiro azul vazio escroto pra nos definir quando um amor não dá certo – e essa metáfora é a prova do desvio que a banda propõe. O disco inteiro é prova disso, aliás."